sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Paraitinga.

Paraitinga, na língua tupi-guarani que predominava na região paulista significa: Rio de águas claras  Para-(rio); -i-(águas); tinga-(claras).
 A história de Salesópolis está intimamente ligada ao Rio Paraitinga. Sua demarcação cartográfica original (divisor de água) ia de sua foz, na confluência com o Rio Tietê, até a sua nascente. Hoje, após os ajustes políticos, ele nasce no município de Paraibuna. Se o Rio Tietê é famoso em todo o estado, o Paraitinga é o mais importante para o município. Só nos últimos trinta e cinco anos é que a água que abastece a cidade passou a ser captada do Tietê.
A origem do primeiro núcleo habitacional se deu no século XIX. Era ao lado de uma represa natural constantemente alagada, compreendendo, exatamente, toda a extensão do atual lago artificial.
A primeira atividade econômica era a pesca, mas a olaria, nas suas bordas argilosas, teria sido a principal fonte de renda de Antonio Martins de Macedo (Aranha), reconhecido como o primeiro hospedeiro onde se formou São José do Paraitinga e, posteriormente, Salesópolis.
Em suas margens despontaram a agricultura de subsistência. Arroz, feijão, cana de açúcar, fumo. No pós Primeira Guerra conheceu a batata inglesa, entremeada com a agropecuária. A permanência de proletários em suas margens as manteve com poucas alterações.
Nos anos quarenta do século passado, recebeu o plantio do Sisal o que resistiu por sessenta anos gerando renda e progresso.
O assentamento da Colônia Japonesa, hoje, nos arredores do Distrito, trouxe diversificação de produtos que dependiam diretamente dele.  Há ainda destaque para os Ardachinikoffs, descendentes de russos que ainda vivem de plantas irrigáveis.
Nos anos cinqüenta foi a vez do aproveitamento da esteira para banana.
A fase econômica da taboa (cerca de vinte anos) ocorreu sem a danificação do aspecto físico da região, mas ele passou a ser drenado para a agricultura. O solo era argiloso contendo uma pequena camada de areia.
Ainda nos anos sessenta, o aperfeiçoamento do eucalipto para a celulose levou a exploração dessa madeira para as suas cabeceiras, o que predomina até hoje. Já na década de setenta, Salesópolis passou a fazer parte da Grande São Paulo e seu território integrou a área de proteção de mananciais.
Em 2001, o município virou Estância Turística e, em 2005, a Represa do Paraitinga tornou-se realidade.  Sua função, agora, é abastecer a Metrópole; com o advento do reservatório, vai oferecer, também, lazer aos paulistanos e visitantes. Isso impediu o avanço de atividades industriais poluentes, mas deteve o progresso da agropecuária, da taboa, do carvão e concentrou-se na exploração da monocultura do eucalipto que, por si, afeta diretamente o volume aquífero das nascentes. 

Esse é o desafio: acompanharmos essa constante metamorfose; adaptarmos às suas mudanças, nos prepararmos para o futuro e resguardar aquilo que já foi e que jamais será o mesmo. 

sábado, 25 de outubro de 2014

Ereção da Capela Curada de São Jozé do Parahytinga.

No dia de hoje, conforme documento transcrito há 183 anos, a Comunidade de São Jozé do Parahytinga ganhava sua primeira demarcação geográfica.

PROVISAO DE ERECÇAO DA CAPELA CURADA DE SAO JOSE DO PARAHYINGA
                                                   (Livro do Tombo)

                                     Dom Manuel Joaquim Gonçalves de Andrade, por mercê de Deus e da Santa Sé Apostólica, Bispo de São Paulo, do Concílio de Sua Majestade Ilustríssima, Constitucional, etc.
Foto Faria
                                   Aos que esta Nossa Provisani virem, Saúde e Benção em o Senhor,
    Fazemos saber que attendendo Nós ao que por sua provisam representaram os moradores do Bairro do Parahytinga, termo da Villa de Mogy das Cruzes, e ao officio de 24 de Janeiro do corrente anno; que nos foi enviado pelo Conselheiro Geral desta Província. Havemos por bem declarar Capela Curada a de São Jozé da Parahytinga, do ditto termo de Mogy das Cruzes, e será a sua *díviza com a ditta. Villa a Ponte do Parahytinga, pelo lado esquerdo the ganhar o Pico do Serrote, **Seguindo dahi pelo mesmo; e pelo lado direito da ditta Ponte the chegar o Rio Tietê, seguindo por elle assim the onde faz Barra o Rio Claro.
                                   E para a todo tempo constar será esta registrada nos Livros do Tombo tanto da ditta Villa como da mencionada Capella, Curada.
                                     Dada em São Paulo, sob Nosso Signal e Sello das Nossas Armas, aos 25 de Outubro de 1.831.
                                E eu, o Pe. Fernando Lopes de Camargo, Escrivam Ajudante da Camara de Excelência Reverendíssima, que escrevi.
                                     Lugar do Sello                                                        + Manuel, Bisp
                                    
                                     Nada mais continha, Mogy das Cruzes, 13 de Setembro de 1.834.
                                    O Vigário Pe. Joaquim Franco de Camargo

Transcrito fielmente do livro Notas de História Ecelesiástica ‑ 11 Mogy das Cruzes e seus fundadores ‑ 111 Baruery‑Parnahyba ‑ IV Cutia ‑ 1937 ‑ Empresa Graphica da "Revista dos Tribunais" ‑ Rua Xavier de Toledo, 72 ‑ São Paulo ‑ de autoria do saudoso Dom Duarte Leopoldo e Silva, Arcebispo Metropolitano de São Paulo.

Mogi das Cruzes, 18 de Março de 1.968.
Pe. João de Oliveira Rosa Filho, Chanceler da Diocese de Mogi das Cruzes.
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Os pontos evidenciados são resultados de pesquisa pessoal. O primeiro cita: *díviza com a ditta. Villa a (até) Ponte do Parahytinga (nas proximidades do atual paredão da represa do mesmo rio), pelo lado esquerdo the ganhar o Pico do Serrote (poderia ser a Pedra ou Pico do Itaguassú-), **Seguindo dahi pelo mesmo; e pelo lado direito da ditta Ponte the chegar o Rio Tietê, seguindo por elle assim the onde faz Barra o (foz do) Rio Claro.
Vista da Serra dos Monos - seguindo pela estrada da Barra - é possível notar toda a extensão do Vale do Paraitinga até a conhecida Pedra ou Pico do Itaguassú (pedra muito grande). De outro ponto elevado, desta vez pela estrada do Barro Amarelo (Pico da Torre), é possível ver grande extensão do Rio Tietê até a foz do Rio Claro. Somando os dois pontos de observação e considerando o critério divisor de águas, dava para se ver uns 80% das terras que estaria sob jurisdição eclesial da nova comunidade. 


Com documentos de André Ricardo da Silva e Foto Faria.

terça-feira, 21 de outubro de 2014

A Fábula do Porco-espinho.

Durante a era glacial, muitos animais morriam por causa do frio.
Os porcos-espinhos, percebendo a situação, resolveram se juntar em grupos, assim se agasalhavam e se protegiam mutuamente, mas os espinhos de cada um feriam os companheiros mais próximos, justamente os que ofereciam mais calor. Por isso decidiram se afastar uns dos outros e começaram de novo a morrer congelados.
Então precisaram fazer uma escolha: ou desapareciam da Terra ou aceitavam os espinhos dos companheiros.
Com sabedoria, decidiram voltar a ficar juntos.
Aprenderam assim a conviver com as pequenas feridas que a relação com uma pessoa muito próxima podia causar, já que o mais importante era o calor do outro.
E assim sobreviveram.
Moral da História
O melhor relacionamento não é aquele que une pessoas perfeitas, mas aquele onde cada um aprende a conviver com os defeitos do outro, e admirar suas qualidades.


Publicado no Messenger. Imagem Google.

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Avenida Prof. Adhemar Bolina.

No final dos anos 60, no século passado, Salesópolis - ou a Vila, como era chamada pelos pioneiros - se viu invadida por grande alvoroço. 
A implantação da primeira linha de oleoduto - entre São Sebastião e Paulínia - trouxe muita agitação para o município. A empresa Techint – Companhia Técnica Internacional- instalou uma de sua base de operações nos arredores e a pacata cidade se viu tomada pelo que havia de mais avançado na engenharia civil. Junto com os equipamentos veio levas de pessoas com sotaques e hábitos inovadores. O resultado foi o avanço populacional oriundo da imigração típica da obra, do êxodo rural provocado pela desapropriação do terreno alagado pela Barragem de Ponte Nova e daqueles que viam nas ofertas de emprego uma nova perspectiva para o futuro.
Em meio a essas mudanças, o tráfico na rua XV de Novembro transbordava com presença de grandes carretas e acentuou a necessidade de se criar uma alternativa para desafogar o trânsito local.
A instalação da segunda linha de tubos, pela Techint, já coincidia com a euforia do uso do eucalipto na celulose e a presença do Oleoduto abriu e melhorou o acesso às montanhas da Serra do Mar e ao Vale do Paraíba.
Segundo o pioneiro Marcílio Santos de Morais, o Moacir Catarino, “A empresa Papel Simão (atual Fibria) investia na região da Bela Vista, em Santa Branca, substituindo as áreas de canaviais por eucaliptos. Eram dois “paus-de-arara” transportando funcionários diariamente, ao mesmo tempo em que o plantio feito, em larga escala, pela Companhia Suzano na cabeceira do Paraitinga começava a produzir. Era comum ver caminhões quebrados no centro ou nas partes elevadas da rua central. Em dias de festas ou na primeira quinta feira do mês, a circulação ficava tumultuada”. Conclui Moacir (Foto).
O primeiro passo foi a drenagem das margens do Paraitinga entre a Rua Abílio dos Passos e a atual Sebastião Nepomuceno.As primeiras viagens de eucalipto, da Gleba 09, foram realizadas pelos senhores José Antônio Pinto (Zé Chaves), João Barbosa (Sabino), o próprio Catarino, entre outros, enquanto a avenida continuava a ser construída.
Em 1977 era possível transpô-la com carros de pequeno e médio porte.
O sucesso do aterro marginal e a triplicação do transporte trouxe o asfalto, feito notável na época. Crente da construção da segunda mão viária, na outra borda do rio, não foi considerado o feitio de acostamento na primeira.  
Batizada de Professor Adhemar Bolina, com a conclusão do asfalto Salesópolis-Tamoios, a avenida nova recebia também os veranistas que visitavam o litoral norte.
A partir de 1985, a forma de carregamento de madeira foi alterada. Os caminhões de 7, 12, 14 toneladas cederam espaço para as carretas e veículos conjugados. Era o resultado da primeira experiência com balança na atual Alfredo Rolim de Moura, que inviabilizava o transporte de eucalipto, para o consumo final, com caminhões de pequeno porte.
No final da década de oitenta, coube ao Sr. Francisco Wuo, vice-prefeito eleito, arborizar toda a extensão concluída.
Mesmo sendo o volume de cargas transportadas cada vez maior, em 1994, foi eliminada a função de mão dupla em grande parte da rua XV de Novembro sobrecarregando ainda mais o corredor marginal.
Na última década, a alameda ganhou o complemento final da segunda via, mas a parte que destinava ao entroncamento com a Rodovia Alfredo Rolim de Moura, no sentido litoral, continua sem perspectiva de construção e recebe caminhões com cargas que variam de 5 a 70 toneladas. O resultado são os rombos que a avenida construída sobre entulhos vem apresentando; a restauração da rede de esgoto, em sua extensão, mostrou isso.   
Outros fatos vieram a culminar com o desassossego da população. Um deles foi a decretação de área de lazer no trecho final da segunda via - entre a Rua Sebastião Nepomuceno e a Avenida Camargo Primo -, além do remanejo da linha de ônibus intermunicipal que transitava pelo centro e das cargas pesadas para a “Adhemar Bolina”. Como existe comércio na extensão desse logradouro, qualquer veículo que estacione interrompe o trânsito e, somem-se a isso os ônibus escolares, além dos utilitários que seguem em mão dupla num trecho sem acostamento e com má sinalização.
Com a realização do calçamento, nota-se que um acostamento funcional está descartado. Outro desconforto enfrentado pelos munícipes é a falta de acomodação digna. Além de caminharem por longas distâncias, necessitam de paciência para aguardarem por uma condução de horários incertos, amontoados em pontos em toda a extensão da Avenida e, enquanto do outro lado, por razões políticas ou financeiras, agora batizada de Avenida Pedro Rodrigues de Camargo Neto, na sua fase final é utilizada por poucos usuários em seu lazer.
Assim, a Avenida Professor Adhemar Bolina, cumpre o seu papel e, como o seu patrono, é polêmica. Para Salesópolis é a saída, mas para os salesopolenses tem sido o seu algoz.

Fotos: CV e Foto Faria

Dia do professor.

Parabéns aos nossos professores. Pessoas que abraçaram a dura arte de ensinar e a fizeram com esmero. Aqueles que nos acolheram numa época em que perdíamos em ideias, e fizeram de nossa educação o seu ideal.


domingo, 12 de outubro de 2014

Resíduos.

Uma das diferenças entre os homens e os animais está nos resíduos. O lixo animal é absorvido pela Natureza em poucos dias; o lixo deixado pelos humanos pode levar décadas.

Um exemplo: a eleição foi na semana passada e ainda há muito lixo espalhado pelas ruas nas regiões afastada do centro. Se fosse restos dos animais já estariam reciclados.

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Aula prática.


Era sábado cedo, e amigos do Patrick se reuniam. Alunos de primeira série se juntaram para soltarem pipas. Já haviam feito isso antes, mas, em separado.
O mês de julho no hemisfério sul tem os dias curtos, e naquela manhã eles se achavam num local descampado. Preferiam brincar no pátio da escola, ou na avenida, mas os pais alegavam perigo no fio elétrico.
negociodefamília.com.br 
Chegou o Clayton de gorro amarelo-creme com uma bola de lã na cabeça - parecia um sorvete-; o pai do Lê é barrigudo e careca - ele não usava nada na cabeça, mas tinha um cachecol. Quim, filho do camponês também não veio, nem o Nino, filho do marceneiro; vai que eles não têm conta na papelaria. Era só chegar pegar e marcar...
Tinha pipa de origem chinesa, japonesa, com grandes rabiolas ou sem nada.
Havia serração e as crianças, bocejando, esperavam. Por último, o sol foi se levantando, vermelho, inchado - não são só os olhos das crianças que ficam assim quando saem da cama-, mas cadê ele? O vento não veio. Ansiosos, alguns ensaiavam corridas com suas estrelas. Todos estão prontos, sonolentos, mas a energia invisível que faz as pipas e as árvores ricochetearem faltou ao encontro. Os brinquedos estavam estáticos. No ar elas são poderosa, imponentes; mas quando se veem no chão, são inofensivas. Diferenciam-se pelos tamanhos, mas se igualam na incapacidade de expor a sua beleza, o seu poder. Sem a ação invisível do vento elas são peças caras em desuso.
O sol foi recobrando sua aparência e se tornando quente. Enquanto esperam, alguém convidou a todos para um chocolate na padaria. Contrariados com seus papagaios nas mãos, alguns se revoltavam, choravam, mas se entreteceram pelos doces que havia na vitrine da panificadora. Desiludidos pelo fracasso das pipas, viam-se reunidos num local diferente da sala de aula, sem o mando de professores e com total liberdade.
Viram que pessoas compravam pães, café, açúcar, adoçantes. Ainda é cedo, mas as crianças de cor negra não usam agasalhos; será que elas não sentem frio? Nas proximidades do descampado, há pessoas ao relento, adormecidas... Porque será que elas não foram pra casa?
Outro fato que os amigos de Patrick notaram é que as pessoas, as casas e os carros, na medida em que vai se afastando do centro, vão se tornando mais simples, a rua é esburacada. Aquelas roupas que estão à venda nos brechós e feiras de usados invadem a periferia. Isso explica os modelos que a Conceição, colega de classe, usa.  Dançam o funk, o sertanejo; as meninas usam roupas justas; há aqueles que têm tatuagens, brincos e piercings em partes do corpo. Será que não dói?...
Abismados com o choque dos costumes se encurralam próximos dos pais enquanto as crianças da redondeza, vendo as pipas, vão chegando, rodeando e se apoderando delas. Falam do cerol que eles usam, o mesmo que a professora vive dizendo que é perigoso. Vendo o interesse daqueles pequenos pelos brinquedos, um dos pais sugeriu que fossem doados àqueles garotos; eles os receberam e saíram invadindo a rua e o trânsito.
O ambiente se torna tenso. Alegando que o sol estava forte, que era a hora de ir embora, os colegas vão saindo.
Tiveram uma aula prática de vida e, embora não entendam o ocorrido ou o que o futuro lhes reserva, os momentos contrastantes que conheceram é só um exemplo do paradoxo social com o qual eles terão de conviver.    

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Solo fértil.

A mente humana é um terreno fértil. Tudo o que se planta vinga! E tudo o que se alimenta, cresce! Pode ser amor, ódio, violência ou devassidão. Esse solo fecundo tudo aceita!

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

A Sinfônica.

O silêncio se impõe de forma inquietante. Instintivamente ela se eleva e traça no ar movimentos compassado e de forma ininterrupta. Ela, a batuta, com sua aparência franzina é enérgica! No seu vai e vem, convoca a cada instrumento ordenando sua entrada ou saída de cena. Assim, todos os metais, por ordem são chamados e, mesmo com seu tom estridente, não se impõem sobre o coro virginal oriundo das cordas. Igualmente, o baixo tuba e os tambores se respeitam. Juntos, criam uns sons harmoniosos, envolventes. Não importa a diferencialibidade dos mais estranhos e exóticos instrumentos, na orquestra tudo se encaixa. Se executarem grupos de pianos, corais de centenas a milhares de vozes, tudo sairá uníssono. Em seu momento, a sutil flauta faz frente às sopranos, aos tenores e, até mesmo ao poderoso gongo japonês. Em tudo há cadência, pois, embora diferenciados entre si, os graves, contraltos ou aveludados, seguem pela mesma trilha da partitura que, com suas poucas linhas, permite breves escapadas, mas nunca o seu total desprendimento. Agindo dessa forma, têm suas sonoridades respeitadas, portanto; se grandes ou pequenos, seguem pela mesma estrada. Ordeiramente vagam pela breve, semibreve até as semifusas em compassos certeiros sob a regência da implacável e dinâmica batuta. As “fusas” exigem dos instrumentistas  muita agilidade; são como crianças saudáveis  que recreiam pelas ruas. As “colcheias”  se assemelham aos adultos que ponteiam a harmonia;  as “breves”, lembram o lado metódico da população. Todo o conjunto forma um evento singular que embala os sonhadores. As peças se alteram: clássicas, dramáticas, as sonatas. A perfeição do sincronismo musical se dá em virtude da rígida marcação e da interpretação das notas e escalas pelos músicos. Por trás de cada peça, há um ser humano dando vida aos símbolos musicais. É o cérebro o conversor dos sinais em sons e, através deles, os gráficos determinam os movimentos dos dedos nas cordas ou nos teclados; das mãos hábeis nas baquetas ou na batuta que os rege com todo o vigor.
Agora, convenhamos. Se por trás de cada instrumento há pessoas e, se parte delas a execução afinada da sinfonia; então, porque na vida real o mesmo não sucede? Se os músicos estudam durante a infância para que, quando adulto, possam ocupar um lugar de destaque na orquestra; mas as pessoas treinam a vida inteira para se harmonizarem! Têm sua Carta Magna e elegem seus regentes, aos quais por si se submetem a todos os tipos de exploração. São talentos dignos de grandes peças, mas se fazem inúteis diante incontáveis momentos inglórios originando um imenso submundo explorado indignamente. Formam uma orquestra apática num concerto desafinado. Mas, afinal, na sinfônica humana, quem desafina?...São os “músicos” ou os “regentes”?

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Os dois lados da moeda.

O fantástico mundo da ilusão está à disposição de todos. A qualquer hora vemos, por entre as nuvens, grupos de pessoas que voam alegremente; da mesma forma, na terra, bandos de gatos fazem cabos de guerra com pitibuls. Veem-se borboletas conversando com as flores, uma manada de leões aplaudindo o desfilar de saudáveis gazelas. O incrível mundo onde os animais se confraternizam insiste que, nele, o beijo é técnico e as insinuações sexuais, também.
A televisão, com pouco mais de oitenta anos de existência, ocupa um espaço impensado pelos  homens que a inventaram. Gera ilusões; é educativa e, ao mesmo tempo, dispersiva. Sendo fruto do capitalismo, qualquer minuto pode valer milhões. É penetrante; seus anúncios, mesmos os mais absurdos, vão aos poucos se enraizando nas mentes estressadas transformando o indigesto em elegante, o cafona em moda. Por estar diretamente ligada ao consumidor traz sempre novidades. Tornou-se informante de verdades e inverdades; é capaz de mergulhar nos abismos oceânicos trazendo à tona animais que jamais viram a luz solar. É capaz de mostrar um óvulo se desprendendo do ovário; as veias internas, os canais do sistema digestivo. Por estar ligada à base exploratória da opinião pública, vive criando furos jornalísticos e ocultando vexames políticos. Nos horários vespertinos exploram a miséria em busca de audiência; cultua o ridículo, o tacanho em busca de debates. Nos programas “chamados populares” exibem “gatos e gatas sarados”, de “cabeças vazias” estimulando o lado sensual que a humildade tem em abundância: a imaginação fértil para assimilarem os modelos talhados pelos clérigos, os noveleiros e poetas, transformando instintos reprodutivos em amor com os mais diversos adjetivos. É um veículo contraditório; por um lado traz cultura, por outro, o estímulo à violência como entretenimento. Mistifica assuntos banais, mas é a desvendadora de mistério e tabus. Seus refletores aceleram processos, faz recuar o político oportunista, porém, é retaliatória, direcionando os melhores programas aos canais fechados, indiretamente, alimentando a divisão social. Sua imponência a capacita a fazer o bem a toda à humanidade, contudo, seus diretores preferem louvar a desgraça do agreste a cobrar da elite providências para salvar aquele povo. No fim de noite, por exemplo, mostra em cadeia nacional o teatro encenado pelos políticos, com seus coadjuvantes, e o humor bestializado dos tiriricas da vida. É a fonte preparada para publicar os feitos e as mazelas do mundo, no entanto, nas eleições, investe nas pesquisas; indiretamente, induzindo os eleitores a apoiarem seus interesses. É um veículo que cumpre a sua função e, pelo avanço conquistado, mostra que traduz a exata aspiração de seus povos. Faz coisas glamorosas, mas peca pelo excesso de ilusão.
Sendo obra humana, justificam-se tais imperfeições. Pudera. Afinal, vivemos num mundo onde cães, gatos, leões e antílopes são inimigos naturais.

(A tv é) “Um monstro na frente do qual as pessoas irão desperdiçar sua vida”.

Philo Farnsworth (1906-1971), reconhecido como o autor da televisão.  Revista Superinteressante – 11/1999.